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sexta-feira, 31 de dezembro de 2021

UM CUMBO NA CIDADE

Cumbo (tchumbo) é, segundo Moisés Malumbo, a menor unidade agrícola familiar entre os ovimbundu, algo também aplicável aos ambundu, cuja família etnolinguística pertenço.

Na escala ascendente, Malumbo coloca: 

a) cumbo (à volta de casa) onde se colhe a verdura imediata;

b) naka (perto à meia distância de casa) onde se cultivam hortaliças, legumes e tubérculos. Naka é equivalente à zona baixa ou sob regadio.

c) épya (à distância razoável de casa) onde se cultivam bens de consumo permanente e excedentes para permuta e/ou venda.

A mulher tem um "kadescapado" anexo ao muro da casa, onde concentrou material de construção para vedação posterior.

Vou fazer o meu cumbo (pronuncia-se tchumbô) e deleitar-me com o crecer das plantas sobrevivas. Já estou vacinado do vandalismo da vizinhança: chegam em hordas, arrancam as plantas pelo simples prazer de não deixar o vizinho ter plantas no canteiro ou ao lado de casa. Não faz mal. O bem sempre vence!

Inspirado pela irmã Maria De Lurdes Bartolomeu, cuja estufa visitei este mês, e pela tia Judith Luacute que é apaixonada pelo verde (comestível) iniciei com duas bananeiras que gemiam asfixiadas dentro do quintal por falta de sol. Hoje a horta é grande e apresenta mamoeiros, masambala (massambala), ingombo (quiabo), ananaseiros, espinafre, videira, cacaueiros, goiabeira, romãnzeira, longaneira, maracujazeiros, tamarineiro e até duas tamareiras.

Assim termina meu 2021.

segunda-feira, 29 de novembro de 2021

NOVO MEMBRO NA FAMÍLIA

Do Dondo a Luanda, antes de chegar à ponte sobre o Lukala, está uma aldeia que atende por Km 35. A fazer a descida, depois da curva, está sobre um montículo a casa do Tio João. Foi servidor público, em Luanda, até à sua reforma. Aposentado, preferiu o campo, regressando à sua área de origem.

Disse-me que tem um pomar: mangueiras, laranjeiras, limoeiros, tangerineiras, mamoeiros, gajajeiras, bananeiras, etc.
- Até mandioqueiras. - Acresceu o sexagenário.
De Malanje ao Dondo, fui sempre espreitando à beira da estrada onde encontrar uma gajajeira. Na viagem à Cabinda, descobri que bastava uma estaca e não semente.
Foi a descer a aldeia do Km 35, com a ponte sobre o Lukala à frente, que vi duas gajajeiras ainda jovens. A casa tinha a entrada principal aberta.
- Ó jovem, como se chama o dono desta casa? - Indaguei.
- É do avô João. Ele não saiu. Está mesmo aí. - Disse-me o adolescente.
Estacionei bem o carro e liguei os intermitentes, para prevenir os que iam a descer, geralmente a zunar¹.
- Pá-pá-pá (palmas). Com licença nesta casa!
A resposta fez-se tardia. Mas insisti com palmas mais fortes e voz mais intensa, até que de dentro se ouviu uma voz adulta a perguntar:
- Kenhê?
- Desculpe. Meu nome é Kanyanga. Gostaria de falar com o Tio João. Não é por mal.
Passaram uns 3 minutos.
- Desculpa, filho. Estava a pôr camisa. - Explicou-se.
- Eu é que peço desculpas. Sou Kanyanga. Gosto de plantas. Estou a fazer um pequeno pomar no meu quintal, em Luanda. Venho de Malanje e só aqui vi gajajeira. Preciso de uma estaca. - Solicitei.
O mais velho, contou a sua graça, seu hobby e sua vida profissional na capitalíssima. Indicou-me as árvores. Eram duas no quintal.
- Podes cortar. É pena que não tenho aqui catana afiada. - Disse simpático.
- Tenho tesoura de poda no carro. Pelo menos, assim não firo a árvore. - Emendei.
Peguei a tesoura e amputei dois galhos pequenos. A árvore mãe também era muito jovem.
Parti para Luanda e os dividi em quatro que lancei à terra. Dois já mostram sinal de vida. Podemos ter gajaja!
=
¹- Em alta velocidade.

segunda-feira, 4 de outubro de 2021

ECI NYÊ?!

Tinha umas 4 ou 5 mandioqueiras no quintal, há dois anos. Quando arranquei a primeira e dei os tubérculos à minha mãe, disse-me que "estavam amargas".
Falei para mim mesmo:
- Vou descontituar essa espécie e plantar outra. Arranquei as demais e sobrara apenas uma estaca, a que me parecia menos desenvolvida.
Quando o meu mano Lauriano Tchoia se fez ao interior, pedi-lhe que arranja-se mandioqueira boa e trouxe dois segmentos de Nambuangongo (espécie reportada como produtora de mandioca doce) que plantei com sucesso, resultando em 4 estacas que aguardam pela chuva para "explodir".
Ontem, 29.09, vendo minhas galinhas a esgravatar o solo pensei:
- Vou arrancar a mandioqueira "amarga" que restou, ao menos elas, que devem ter saudade de mandioca, vão se deleitar.
Enquanto, com a enxada, eu buscava um pedaço que tinha ficado cravado no solo, o Sô Manel, encarregado da obra na Kam&mesa, provou e gritou:
- Sô Kanyanga essa mandioca é que você quê dá às hanga? É mbora mandioca doce!
- Doce? Como assim, se plantei no mesmo dia e minha mãe disse que as primeiras eram amargas?!
- Prova, então, Sô Kanyanga. -Disse ele já com a boca meio "entupida" e com os lábios esbranquiçados.
Peguei uma porção mínima. Não quis acreditar nas palavras dele. Sabem o que minhas pupilas gustativas disseram?
- Engano, Sô dono. A mandioca é de mesa. É doce!
Peguei o tronco e replantei dois pedaços. A mandioca dividi com o Sô Manel e as sete galinhas (receberam um bocadinho para fazer o bico e matar saudades de lavras assaltadas).





domingo, 8 de agosto de 2021

É MAIS DOCE A MANDIOQUEIRA DO QUE O TUBÉRCULO

Sim. Via minha mãe sofrendo, procurando transformar mandioca amarga em bombô e depois fuba. Plantamos a mandioqueira para, em primeiro lugar, dar kizaka (folhas comestíveis), mas tb dar tubérculos (mandioca) que é comestível cru, fervida e ou transformada em fuba (farinha) com que se confecciona o funji (pasta de mandioca).

A dada altura, pensei:
- O que vale ter mandioqueira que só da kizaka? Vou desactivar essa espécie e plantar uma que dê mandioca doce. - Assim pensei e fiz.
Apercebendo-me da ida do mano Lauriano Tchoia a Nâmbuangongo, pedi:
- Mano, faxavor. Preciso de mandioqueira doce. Nem que sejam 50 cm, desde que germine. Uma estaca bastará para em um ano reproduzir outras.
Nê que o kota cumpriu? Trouxe dois pedaços que reparti em quatro. No dia em que os fui deitar à terra, já não chovia.
Pá e enxada na mão, balde de água, um mais outros, até cumprir a empreitada, desactivei as jovens plantas carregadas de kizaka que exalava um verde que brilhava ao sol de meio-dia e mandioca grossa e amarga.
A minha mãe (embora invisual e dizem "quem não vê não sente muito" pelo que não conheceu) não gostou.
Pediu que não fizesse o mesmo com a estaca que se acha no quintal dela (próximo do meu). Expliquei as razões para a acalmar.
Daqui a um ano, estaremos a cortar os caules, já pujantes, e replicar noutros espaços, o que levará a desactivar também a mandioqueira amarga da casa da Velha Maria Canhanga.
Ao mano Lauriano, digo:
- Valeu teres me oferecido mandioqueira doce. Se fosse mandioca, por mais doce que fosse, não teríamos crônica durante o crescimento. Ainda virão outras sobre a colheita da kizaka e primeira mandioca doce.

segunda-feira, 12 de julho de 2021

TEMPO DE COLHER

Um hectare com espaçamento de 4 metros daria para plantar duas mil, cento e dezasseis romãzeiras. Se cada árvore produzisse uma média de 24 romãs/ano, teríamos101568 frutas calculadas ao peso médio de 250g, equivalendo a 25,4 toneladas. Dá para investir!                            

 

quarta-feira, 30 de junho de 2021

OS "AMIGOS" DO CARDOSO

Conheci a hanga¹ na minha infância, durantes as caçadas no Ryaha. Aos meus olhos de criança, elas eram lindas, muito velozes, esquivas e saborosas quando apanhadas num laço.

Eram poucos os que tinham perícia em apanhá-las. Guardei na memória o desejo de ter uma delas um dia quando crescesse.
Comprei as primeiras cinco galinhas-do-mato na Huila, em Dezembro de 2020. Três morreram em momentos distintos e uma sobreviveu.
Às galinhas de Angola, como são designadas pelos brasileiros, vou juntando as de kimbundu², também registando mortes e paciência em repor as perdas e aumentar a quantidade. Tinha tb uma avecuca³ que não chegou a dar em cabidela por se ter antecipado a morrer.
De volta à Huila, em Abril último, comprei outras três hanga (fêmeas) que juntei ao macho sobrevivo (aquele escondido atrás do pilar).
Vindo de Benguela, Moh Canhanga ofereceu-me uma galinha de umbundu⁴ que fui juntar ao galináceo.
A minha maior surpresa foi ver o Cardoso, um dos jovens que constroem a www.kamemesa.com, alimentar as aves colocando a ração na palama da sua mão. Parecia que os animais conversavam com ele, envolvendo-se em grande amizade.
Diz o Cardoso que os animais seguem-no sempre que o veem passar.
¹- Galinha-do-mato.
²- Galinha doméstica (gentia) da região ambundu.
³ Galinha criada em aviário de produção intensiva.
⁴ Galinha gentia da região ovimbundu.

terça-feira, 4 de maio de 2021

HUILANOS QUE DÃO VIDA À KAM&MESA

A primeira remessa era de cinco. Uma fugiu e três pereceram. Chegaram mais três, todas huilanas. Nesses dias em que é o cimento quem mais se faz aos olhos, elas têm sido um encanto.
Galinha do mato ou galinha de Angola

 

sexta-feira, 2 de abril de 2021

ACABA JINGUBA

Já não me lembro de onde consegui as mandioqueiras que "pulavam" de quintal em quintal no Zango 4. Primeiro em casa da minha mãe, depois na "obra" e, por fim, no "Parque de estacionamento" da Kam&mesa.

Por muitas vezes nos deu kizaka. Porém, mandioca doce, nada!
A velha Maria diz que a tal mandioca pode ser pesada e de bom tamanho mas "fuba que é fuba nada!".
Apelei no grupo dos "da lavra":
- Manos, faxavor! Alguém me arranja lá mandioqueira que dá mandioca recarga?
Recarga é aquilo que umas manas vendem nos saquitos, na estrada, e que dizem ser "tiro certo" para os amantes do txuku-txuku.
Meu mano Tchoya disse:
- Mano, ainda espera. Vou arranjar.
No dia em que fui me codornizar em casa dele deu-me dois pauzitos.
- Mano, a irmã do Nambuangongo, a quem pedi por sementeira de mandioqueira, disse "essa aqui é acaba jinguba". Acrescentou que "kutowala sukidi ndenge" (sua doçura é maior do que açúcar). Explicou também que "deve recortar em pedaços de +- 20 cm e plantar horizontalmente".
- Está bem mano. Respondi na hora em que já tínhamos bebido duas pomadas, primeiro o chará dele e depois o meu chará, que acompanharam os passarinhos e a fubada.
Bem, cumpri hoje. A "acaba jinguba" está enterrada no solo e espero que germine. Quanto à que só dava kizaka, ficou desactivada.

segunda-feira, 1 de março de 2021

NO MEU QUINTAL

Uma flor nova

Uma nova fruta

Um sabor novo

Um novo sorriso

Um dia novo!